quarta-feira, 26 de maio de 2010

1. FUNDAMENTOS DA LOGÍSTICA

A logística é vem demandado de forma crescente estudos e trabalhos para a melhoria do desempenho empresarial neste início de século. Mas, por quê? Primeiramente, somente pelo fato de ser responsável por altos orçamentos em todo o mundo. De acordo com Figueiredo, Wanke e Fleury (2003), as 500 maiores empresas industriais brasileiras gastam cerca de R$39 bilhões por ano em operações logísticas. A Harvard Business School Publishing (2002) aponta que as empresas americanas gastaram mais de US$1 trilhão em atividades relacionadas ao fornecimento (aproximadamente 55% em transportes e 45% em estoques). Já no Brasil, estima-se que os gastos logísticos cheguem a R$160 bilhões por ano.

Mas não é somente a preponderância dos custos logísticos nos orçamentos que torna o setor importante. A logística também é diretamente responsável pelo nível de serviço aos clientes, com a promessa de entrega dos materiais adequados, no momento prometido, no local certo e na quantidade esperada. Assim, basta imaginar quanto dinheiro está empatado nos estoques de uma determinada loja e o quão importante é a presença destes estoques adequados no momento da compra pelo cliente, para perceber a relevância desta disciplina.

E o que é a logística? Qual a responsabilidade deste setor? Quais as atribuições de quem trabalha na área e qual o retorno esperado para a empresa? Mesmo sendo tão presente no dia a dia de cada um de nós, como veremos em seguida, a logística ainda traz uma série de questões e muitos não temem em demonstrar uma total incompreensão sobre o seu funcionamento.


Esta falta de informação já se demonstra desde a origem do termo “logística”. Enquanto alguns autores afirmam que a palavra deriva do grego “logos”, que significa razão, cálculo, análise ou de “logistikos”, significando cálculo, outra corrente defende que o primeiro a utilizar a palavra no contexto que atualmente conhecemos foi o francês Antoine-Henri Jomini, general de Napoleão. No francês, o termo “loger” significa alocar, dispor, locar e, neste sentido, a palavra estaria relacionada à distribuição e locação de recursos físicos às operações, neste caso, as operações logísticas militares.



A origem dos trabalhos pela área militar é um fato. Foram os militares que desenvolveram os maiores estudos logísticos e elevaram esta disciplina ao grau de sofisticação atual. É fácil de entender esta relação, já que a logística militar é extremamente importante para o sucesso de uma operação de guerra. Mas não foi sempre assim. Nos tempos mais remotos, a guerra era ainda decidida pela força bruta dos grandes exércitos. Nesta época, os recursos necessários para a manutenção da tropa, como armas, munições, alimentos, remédios, etc. eram obtidos através de saques às cidades nas quais chegavam. Contudo, com o próprio crescimento das cidades-fortaleza, estas operações acabaram perdendo a eficiência. Bastava isolar a área que cercava uma localização que havia sido recentemente tomada, por exemplo, para eliminar todas as fontes de suprimentos de alimentos e assim acabar com uma estratégia de dominação.

Aos poucos a logística se torna uma área cada vez mais fundamental para o sucesso de operações militares. Não é surpresa a logística se transformar, em 1888, em disciplina na Escola de Guerra Naval dos Estados Unidos e ter, já em 1917, publicado pelo coronel Thorpe, do corpo de fuzileiros navais americanos, o primeiro livro: Logística Pura - A ciência de preparação para a guerra.

Dos estudos militares até a difusão e crescimento no meio empresarial, muito tempo e muitas transformações se passaram. Para entender a abrangência desta disciplina, as diversas formas de atuação e sua interação com o contexto no qual está inserida, assim como suas futuras tendências, é preciso dar uma rápida observada na sua evolução.

2. ORIGEM E EVOLUÇÃO

O automóvel, além de ser considerado a máquina que moveu o mundo, concentra na história de sua produção um padrão representativo de todo o gerenciamento das cadeias logísticas mundiais. Desde Henry Ford, antes da primeira grande guerra mundial, com o seu conhecido Ford “T”, passando por Alfred Sloan na década de 30 com o surgimento da GM, avançando com o advento da Toyota a partir da década de 40 até o surgimento do complexo automobilístico da Ford, em Camaçari-BA, muitas mudanças ocorreram na forma de gerir o fluxo de materiais e o atendimento às necessidades dos clientes.

Assim como em outras áreas do conhecimento, os estudos sobre a área logística foram sendo desenvolvidos de maneira constante e gradual, mas é possível apontar alguns marcos importantes na história de sua evolução, que separam momentos históricos diferentes. Ballou (1993) e Ching (1999) apontam uma classificação evolutiva com marcos claros e distintos, porém é sempre importante lembrar que estes momentos não se desdobram igualmente em todas as partes do globo, já que algumas regiões se desenvolvem antes das outras.

Antes de 1950

A década de 50 foi, de fato, fundamental para o desenvolvimento dos estudos por um simples fato: a Segunda Guerra Mundial. Apesar das massivas perdas de vida e de recursos que compõem as guerras, é inegável o aporte de tecnologia que consequentemente surge dos grandes confrontos bélicos.

Observando sob o ponto de vista da logística, acrescenta-se o fato de que a Segunda Guerra foi totalmente desenvolvida no continente europeu, sendo que grande parte das forças aliadas tiveram que se locomove de outro continente, em uma época na qual os transportes não eram tão desenvolvidos: os vôos transoceânicos e as comunicações ainda não tinham atingido o estado atual de conforto. Por isso, o sucesso de qualquer operação militar implicava necessariamente uma boa organização dos seus recursos materiais, movimentação de suas tropas e armamentos, muitas vezes até em segredo, para garantir o sucesso da estratégia.

Antes da década de 50 a logística era muito pouco explorada nos meios empresariais. É claro que havia gestão das atividades logísticas, mas isto ocorria de forma totalmente fragmentada, sem uma coordenação única. Atividades como transporte, produção, estoques, fornecimento, distribuição, etc. ficavam sob responsabilidades diferentes, sem um gestor de logística. Assim, interesses diferentes causavam choques de políticas e de setores. Tenhamos como exemplo o caso de um gestor de produção, cujo principal interesse está na manutenção de sua eficiência produtiva e de seus baixos custos de produção, que consequentemente estará defendendo uma boa quantidade de estoques de matérias primas, levando em consideração as previsões mais otimistas possíveis. Já o gestor financeiro estará muito preocupado com o capital imobilizados nos estoques e as oportunidades que estarão perdendo nas aplicações financeiras, brigando sempre por uma menor quantidade de ativos nos estoques.

Este tipo de conflito ocorria com frequência entre os setores: transporte brigando com produção, compras em atrito com estoques, etc. A tabela abaixo apresenta uma representação da distribuição de responsabilidade e objetivos entre os setores:



Fonte: STOLLE, John F. apud Ballou, 1993.

Entretanto, já existiam alguns trabalhos de pioneiros em estudos logísticos empresariais. Arch Shaw (1912) e Fred Clarck (1922) derivam estudos de áreas como marketing para falar da importância da distribuição e transportes na criação de mercado e demanda.

Décadas de 50 a 70

O período após uma guerra é normalmente marcado por grandes transformações e novas oportunidades. É neste ambiente que os estudos sobre administração e marketing continuam a se desenvolver e temas como distribuição e logística voltam a ser abordados.

Os avanços obtidos na área de logística começam a ser aplicados nas empresas potencializados por novos recursos tecnológicos. As descobertas na área de matemática, computação, pesquisa operacional, o movimento pela qualidade total, a teoria dos sistemas, entre outros fatores, começam a gerar resultados crescentes para as empresas.

Lewis, Culliton e Steele publicam em 1956 um trabalho onde demonstram que o transporte aéreo, com seu alto custo, poderia ser compensado com menores custos de estoques de segurança de materiais. Este trabalho e esta compensação acabam criando o conceito de custo total logístico, que trará mais unidade ao estudo do setor, buscando uma integração e uma visão mais sistêmica.

Um conhecido professor da área de Marketing, Paul Converse, em 1954 apontou a falta de preocupação com a distribuição física. Peter Drucker, famoso escritor da área de negócios, afirma que a distribuição está entre as áreas mais desprezadas e promissoras da América.

Neste momento histórico pós-guerra, além das mudanças populacionais, com o contínuo crescimento demográfico nas cidades e o crescimento dos subúrbios dos grandes centros urbanos, o perfil de consumo da população também passava por grandes ajustes. O consumidor começa a adotar uma postura de “cliente exigente”, fomentada pelo aumento da concorrência e novos tipos de produtos são demandados. Não basta mais aquele produto padrão único de baixo preço, como o automóvel Ford Modelo “T”. O cliente quer variedade e poder de escolha, exigindo mais opções de compra, o que significa maior flexibilidade na produção e controle de estoques diversificados.

O ambiente econômico já não é tão favorável para o crescimento desordenado e a pressão sobre os lucros tende a ser mais forte. A recessão pós-guerra traz a necessidade de um maior esforço dos administradores para cortar os custos e, já que a eficiência produtiva tinha sido extenuantemente trabalhada no início do século, a logística se mostrava um setor de muitas oportunidades para enxugamento dos custos.

Juntemos agora todo este potencial de melhoria de desempenho com uma forte demanda empresarial para redução de custos e novas ferramentas computacionais sendo aplicadas à experiência militar... pronto: temos o início de grandes pesquisas e descobertas em logística. É nesta época, por exemplo, que Jay Forrester começa os estudos sobre as cadeias de distribuição e revela o mecanismo de funcionamento das variações de demanda ao longo da cadeia, o famoso “efeito chicote”.

Décadas de 70 a 90

Observando o cenário mundial neste período, alguns fatos merecem destaque, especialmente para a logística. O primeiro é a guerra do Vietnã, que pouco a pouco foi ganhando uma proporção inesperada até mesmo para os mais pessimistas e demandando recursos importantes daquela que já se tornara a maior economia mundial. Outro fato interessante foi a criação da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) e o embargo comercial de 1973, que foi seguido de uma conseqüente alta nos preços do petróleo, que influencia diretamente nos custos de distribuição e transporte.

O ambiente econômico mundial nesta época demonstrava um período de baixa nas taxas de crescimento econômico e alta nos índices de inflação. E óbvio que em alguns poucos países, como foi o caso do Brasil, o crescimento econômico ainda existia (foi o período denominado “milagre econômico”) e novos empreendimentos eram lançados. Mas, de uma forma mais geral, o mundo enfrentava o período que ficou conhecido como “estagflação”. Neste cenário, os custos de produção e transporte se tornavam muito altos, com altas taxas inflacionárias e aumento nos juros do mercado. Juros altos significam maior custo do capital no tempo, o que, para a logística, representa maior custo dos estoques.

Contudo, algumas práticas de gestão logística já começam a dar resultado e algumas empresas começam a se destacar, não apenas pela melhor gestão dos custos totais, mais buscando um melhor nível de serviço ao cliente. É nesta época que o movimento pela qualidade total começa a tomar vulto como resposta à forte pressão exercida pela indústria japonesa sobre o mercado ocidental, especialmente no segmento automotivo e de eletrônicos.

Esta fase é conhecida como semi-maturidade da logística, com novos estudo e novas tecnologias. A área de logística nas empresas começa a se tornar mais integrada, com um grande aliado que tende a se tornar mais e mais difundido: os computadores pessoais e a proliferação da tecnologia de informação.

Após a década de 90

A década de 90 é um dos maiores pontos de inflexão no desenvolvimento do setor. A logística se torna um grande diferencial para empresas de destaque nos mais diversos setores. O sucesso de empresas como a Dell Computers, a Wall-Mart, a Amazon.com, a Federal Express, entre outras é fortemente ligado a melhorias implantadas em sua logística. O número de empresas que criam diretorias para o setor de logística só demonstra a importância que vem sendo creditada ao seu trabalho. De um mero centro de custos, o setor passa para um dos principais centros de resultados a ser explorado.

Fortes mudanças continuam acontecendo na estrutura econômica mundial e no meio empresarial. O começo da década de 90 começa logo após a queda do muro de Berlim, seguido do fim do império soviético e término da guerra-fria. Os blocos econômicos continuam se desenvolvendo, como a Comunidade Européia, a ALCA, etc. Com eles novas formas e comércio e, por que não dizer de embargos econômicos. A competição ganha novos rumos, tornando-se global. A Internet e o E-business transformam organizações inteiras e surgem novos players no comércio mundial.

Neste cenário a logística integrada ganha muito mais força e novos conceitos e estudos vão surgindo. Nomes e siglas, como Suplly Chain Management (SCM), Efficient Consumer Response (ECR), Just In Time Distribution (JITD), Vendor Managed Inventory (VMI), Quick Response (QR), Theory Of Constraints (TOC), Milk Run, etc. se proliferam como formigas no açucareiro. Junto com a tecnologia de informação, a logística se destaca entre as principais formas de gerar vantagem na concorrência e, principalmente, como forma de responder à dinâmica proporcionada pela revolução da informação.

Aos poucos é possível perceber que esta visão histórica do crescimento do setor pode não ser claramente distinguível em todos os setores e em todas as regiões. Contudo, já dá para perceber a importância do contexto econômico e social nos modelos de gestão organizacionais, permitindo assim a visualização de novas tendências e de cenários esperados para o futuro.

3. OBJETIVOS CONFLITANTES

Uma das maiores dificuldades relacionada à gestão do desempenho logístico é no tocante aos seus objetivos. Se tentarmos observar a questão em partes menores, aí sim, que se torna ainda mais complicado.

Vamos considerar, por exemplo, as diversas áreas que compõem um sistema logístico: compras, produção, estoques, atendimento aos clientes, só para começar. Se nos imaginamos como responsável pelo setor de compras, por exemplo, certamente teremos como uma das principais metas do departamento o baixo custo de uma compra. É claro que outras metas existem, mas esta figurará sempre entre as mais importantes. Assim, não é difícil entender por que os compradores preferem comprar uma variedade menor e com menos frequência, já que assim conseguem otimizar o seu tempo realizando mais compras e diminuindo o custo ta compra. Não é difícil explicar também porque preferem fazer compras em maiores quantidades e menor frequência. Além de reduzir o tempo gasto para a realização de cotações e negociações, com compras mais volumosas, aumentam o poder de barganha do comprador, que negocia maiores quantidades, de uma única vez. Fica muito mais fácil conseguir um preço melhor.

Indo para o setor de produção, o gestor dificilmente terá dúvidas entre produzir pequenas quantidades de peças com uma frequência maior ou produzir um volume maior de cada tipo de produto com uma frequência mais espaçada. Cada vez que precisam trocar a linha de produção para um outro tipo de produto, terão perda de tempo, problemas de qualidade, desperdício de material, etc. Assim, é muito mais interessante promover lotes maiores de produção, com menos “set up” (trocas na linha e ajustes na produção) do que uma produção onde continuamente seja preciso realizar mudanças. O foco do gestor será a produtividade, o baixo custo de produção e a qualidade.

O gestor da área de estoques já terá uma preocupação voltada para os custos de estocagem, preferindo manter um baixo volume de materiais, um rápido serviço de reabastecimento, e pouca movimentação nos seus materiais.

Agora, quando o foco se volta para o atendimento aos clientes, o interesse estará sempre voltado em oferecer uma grande variedade de itens e um volume de estoques no mínimo confortável. Em compensação, o preço terá que ser sempre baixo para garantir a sobrevivência em um ambiente de competição acirrada.

São apenas quatro das áreas que compõem a logística, mas, quando colocamos todos estes objetivos juntos, o que encontramos: um punhado de conflitos! Como pode um gestor coordenar tantas ambivalências e tantos choques de interesse? Basta observar o quadro abaixo:




O cliente quer uma grande disponibilidade de estoque, conflitando com os interesses do setor de depósitos; o setor de compras prefere uma pouca variação do mix de produtos, o que vai contra o interesse do cliente em ter alta variedade de produtos; o setor produtivo quer trabalhar com lotes maiores, o que irá criar um problema para os depósitos, com estoques maiores, e para os clientes, com pouca variedade de produtos. Desta forma, é possível visualizar a teia de conflitos que existe em grande parte das organizações, onde, muitas vezes, temos a impressão de que o chefe de um outro setor está trabalhando contra você o tempo todo.

Tomando um exemplo mais específico: qual o objetivo da empresa? Maximizar o lucro, correto? Como podemos atingir este objetivo?

Quando fazemos esta pergunta a um grupo de estudantes ou mesmo de empresários, a resposta é rápida: para aumentar o lucro, diminuímos os custos (esta abordagem é sempre a preferida, não é?) ou aumentamos a receita e as vendas. Vamos então desdobrar esta afirmação na figura a seguir.

É sabido que a redução de custos, por ser a preferida de nove entre dez empresários, já tem esgotado quase toda a sua capacidade de resultados. Redução de custos na faixa de 3% do total já é algo quase impossível de atingirmos hoje; somente com drásticos corte de orçamento. Mas tem um setor no qual, também é indiscutível a possibilidade de cortes: os estoques. Quase todos os negócios possuem estoque em excesso. Basta fazer um levantamento da quantidade de capital empatado em estoques, ou da quantidade que está parada há mais de seis meses sem se movimentar, que chegamos à conclusão que é possível reduzir os estoques.


Por outro lado, quando o pessoal de vendas é abordado sobre uma das formas de garantirmos um incremento nas vendas, indubitavelmente encontrará uma resposta entre as demais: aumente a quantidade de estoques disponível para vendas! Assim, vemos claramente um conflito: aumentar ou reduzir os estoques? Qual é o melhor para a lucratividade?

E o problema não é tão simples. Em 2001, segundo o New York Times, a Cisco Computers anunciou que estava reduzindo dois terços do material em seu inventário, na estonteante quantia de US$2,5 bilhões, enquanto um dos seus fornecedores indicava que ainda existia possibilidade de redução. Mas, do outro lado da moeda, de acordo com a Harvard Business School Publishing, a Compaq, outra empresa da área de tecnologia de informação, estima ter perdido no ano de 1995 entre US$500 milhões a US$1 bilhão em vendas por não ter laptops e desktops suficientes para os clientes no momento da compra.

Mais estoque ou menos estoque? Mais custo ou melhor venda?

De certo modo, esta corda bamba entre custo e desempenho estará sempre presente quando tocamos no assunto de desempenho logístico. Podemos então resumir o principal objetivo do setor de logística como sendo:

“ O OBJETIVO CENTRAL DA LOGÍSTICA É ATINGIR UM NÍVEL DESEJADO DE SERVIÇO AO CLIENTE COM O MENOR CUSTO TOTAL POSSÍVEL”

Assim, ao otimizarmos as operações logísticas em um empreendimento, estamos atacando em duas faces bem distintas, mas não menos importantes entre si: custo e serviço ao cliente. Trabalhar com o mínimo de estoques ou gastos em transportes, mas atendendo bem o cliente final é o principal desafio de quem trabalha no setor. E um objetivo não pode nunca excluir o outro.

4. CONCEITOS BÁSICOS

Logística e Cadeia de Suprimentos

O conceito de logística, atualmente difundido pelo Concil of Logistics Management apresenta que:

“Logística é o processo de planejamento, implementação e controle do fluxo eficiente e economicamente eficaz de matérias-primas, estoque em processo, produtos acabados e informações relativas desde o ponto de origem até o ponto de consumo, com o propósito de atender as exigências dos clientes.”

Contudo, basta dar uma olhada nos títulos das bibliografias deste módulo para entender que novas vertentes vêm surgindo e que alguns conceitos antes extremamente bem difundidos começam a ficar cada vez mais confusos. É crescente a utilização de termos como Cadeia de Fornecimento, Cadeia de Suprimentos, Cadeia de abastecimento entre as literaturas especializadas em logística. Além disso, nas próprias empresas, principalmente as multinacionais, é facilmente perceptível o surgimento de novos setores ou novos cargos, como, por exemplo: gerente ou diretor de Supply Chain. Mas, além do pomposo nome, o que há de novo neste cargo? O que diferencia a atuação do setor de Supply Chain para a área de logística? Afinal, em algumas empresas, as duas áreas continuam existindo e compartilhando objetivos.

Se perguntarmos aos profissionais da área, muitas vezes não conseguimos muita ajuda na identificação das diferenças entre logística e Supply Chain, afinal, não conseguimos um consenso nem mesmo entre as empresas. Em algumas indústrias, a área de Supply Chain só se preocupa com o setor de suprimentos, em outras, é uma extensão do relacionamento ao cliente.

A confusão começa até mesmo na tradução. Vamos encontrar pelo menos três traduções distintas para Supply Chain na literatura brasileira: Cadeia de Suprimentos, Cadeia de Fornecimento e Cadeia de Abastecimento. A primeira e mais comum, entendida como uma tradução ao pé da letra, de Supply para Suprimentos, também traz algumas más interpretações. Isso já que por Suprimentos entendemos o setor responsável pela aquisição de materiais, ou compras. Assim, quando falamos em cadeia de suprimentos, muitos interpretam erradamente como relacionada somente aos fornecedores da empresa. Justamente por isso que alguns autores preferem utilizar o termo Cadeia de Fornecimento ou de Abastecimento.

Outro ponto conflitante está no conceito de cadeia de suprimentos. Segundo Robert B. Hamfield, da Universidade de Michigan, a Cadeia de Suprimentos “abrange todas as atividades associadas ao fluxo e à transformação de bens desde a matéria prima ou extração até o usuário final, incluindo também todos os fluxos de informação que permeiam este processo”. Bem, se fizermos uma comparação com o conceito de logística apresentado no início desta seção, não encontraremos muitas diferenças. Segundo Wankee (2003) a gestão da cadeia de suprimentos é muitas vezes percebida como uma simples extensão da logística, quando incorporados os clientes e os fornecedores de uma empresa.

Porém, a definição apresentada de logística a coloca como uma parte componente daquilo que comumente se entende por gerenciamento de cadeias de suprimento. Ao pé da letra, a “logística é a parte do gerenciamento de cadeias de suprimento responsável pelo planejamento, implementação e controle, de modo eficiente e eficaz, do fluxo e armazenagem de produtos (bens e serviços) e informações relacionadas, do ponto de origem até o ponto de consumo, com vistas ao atendimento das necessidades dos clientes”.

Wankee ainda coloca que a definição de gerenciamento de cadeias de suprimento apresentada em 1998 pelo Global Supply Chain Fórum está fundamentada em seu entendimento a partir de um conjunto de processos integrados. Em suas palavras, “o gerenciamento de cadeia de suprimentos consiste na integração dos principais processos de negócio a partir do consumidor final par ao fornecedor inicial de produtos, serviços e informações que adicionam valor”. O gerenciamento de cadeias de suprimento seria, portanto, uma tarefa substancial mais complexa que a gerência logística do fluxo de produtos, serviços e informações relacionadas do ponto de origem ao ponto de consumo.

O conceito de logística já é centenário, tratando de todo o processo de movimentação, ou disposição de materiais, mas que normalmente é considerado entre os fornecedores diretos da organização até o seu cliente direto. Já o conceito de cadeia, ou corrente de suprimento é mais recente. Data da década de 90 e representa a corrente, ou cadeia de empresas relacionadas ao fornecimento de um determinado bem. Ou seja, todas as empresas envolvidas no processo, da matéria-prima extraída da natureza até o produto final entregue ao último consumidor.

Vejamos, por exemplo, uma cadeia de fornecimento automobilística. Se considerarmos a parte metal, uma das dominantes, onde começa o ciclo? Qual é a primeira empresa envolvida no processo do fornecimento de materiais para os automóveis? Neste caso é a empresa de mineração, que extrai o minério de ferro das minas, passando então para a siderúrgica, segundo elo da cadeia. A siderúrgica transforma o minério em aço que será então transformado pela metalúrgica e, em seguida pelas fabricantes de autopeças. O próximo elo, um dos maiores, é o da montadora, que faz a montagem e distribui para as concessionárias de veículos. E ainda existem as empresas de distribuição, que fazem o transporte entre cada um destes elos. Todas estas empresas constituem uma corrente, ou cadeia de suprimentos. Uma cadeia porque é fácil entender que, mesmo para os automóveis, ainda existem várias outras cadeias inter-relacionadas, como a de plásticos, de eletrônicos, de couro, etc. Na verdade não se trata de uma corrente simples, mas uma malha de correntes.





O conceito de gestão de cadeia de suprimentos surge então recentemente, quando a tecnologia e informação e de gestão já é capaz de permitir um planejamento e controle que extrapola a logística tradicional, indo ao fornecedor do fornecedor, buscando desde o fornecimento da matéria-prima extraída da natureza até o produto final, entregue nas mãos do cliente. Trata-se então de um conceito mais amplo que o conceito inicial de logística. Quando uma empresa inicia um processo de gestão da cadeia de suprimentos, deve estar buscando planejar, acompanhar, controlar e intervir no fluxo de materiais não somente na vizinhança da própria empresa, como no caso da montadora. Mas estará acompanhando, controlando, mantendo as informações e, preferencialmente, intervindo no fluxo de materiais de forma mais ampla possível, sabendo o nível de estoque desde o fornecedor do fornecedor até a taxa de consumo de cada produto junto ao consumidor final do processo. Este nível de acompanhamento só é possível hoje graças à tecnologia disponível hoje e ao nível de integração empresarial.


Demanda

A gestão da demanda é uma das partes mais importantes para o sucesso de um bom processo logístico. Mesmo sabendo que é o Marketing o setor que detém a responsabilidade sobre as atribuições ligadas à demanda, cada vez mais a percepção da logística e da cadeia de suprimentos interage com as necessidades dos clientes. Para tanto é preciso conhecer algumas características e algumas classificações da demanda.

Quanto ao tipo de produto e à correlação com outras demandas, é possível dividir dois tipos principais de demanda: demanda dependente e demanda independente. Enquanto a primeira é aquela que facilmente pode estar correlacionada a outras demandas, por ser “dependente” do consumo de outros materiais, a segunda não traz uma ligação direta a outro bem ou serviço.


Um exemplo clássico é o do fornecimento de pneus. Quando se trata de uma fábrica de pneus que alimenta a linha de uma montadora, é fácil estabelecer uma relação entre a demanda de pneus pela montadora e a demanda final de veículos a serem fabricados. Isto por que para cada carro fabricado, serão solicitados cinco pneus: os quatro regulares e o estepe. Assim, este exemplo é facilmente apresentado como um exemplo de demanda dependente.

Entretanto, se a fábrica de pneus agora atende a uma rede de revenda de pneus para o público consumidor, não há correlação direta com um produto específico e, neste caso, trata-se de uma demanda independente.

Quanto à forma de atendimento das demandas já é possível encontrar outras classificações básicas. Se a demanda é satisfeita através da geração de estoques, utilizando os estoques par atender às necessidades dos clientes, estamos em frente a um processo “make to stock”, ou de produção para estoque. Neste caso, a fábrica produz com base em previsões de venda e envia para áreas de estocagem, sejam em distribuidores, em varejistas ou até na própria fábrica. À medida que o cliente precisa do produto, consome diretamente deste estoque já pré-fabricado. Como exemplos, temos os materiais de consumo regular, como detergentes, materiais de limpeza, alimentos em geral, etc.

Quando o fornecimento é feito diretamente da fábrica, de acordo com a necessidade real de consumo, estamos falando de um processo “make to order” ou de produção contra pedido. Neste caso a produção só é iniciada depois de definido o pedido, ou seja, depois da necessidade real divulgada pelo cliente. Exemplos clássicos são os materiais fabricados sobre encomenda como equipamentos industriais, peças sofisticadas, vestuário de alta-costura, etc.

Existem também condições intermediárias. “Assemble to order” ou montagem contra pedido ocorre quando itens têm sua produção iniciada, mas as peças ficam aguardando a definição do cliente para o processo de montagem final, que só ocorrerá após o pedido. A Dell Computers era um exemplo de aplicação desta lógica de entrega. Ao contrário dos fornecedores tradicionais, que fabricavam os computadores e os estocavam nas lojas de revenda, onde eram vendidos, a Dell mantinha o estoque de componentes e, somente após o pedido do cliente, que especificava o tipo de monitor, o tamanho da memória, a capacidade do processador, etc. que o fabricante iniciava a montagem das peças e a diferenciação do produto. Desta forma evitava o estoque de equipamentos prontos, aguardando uma “possível” compra. O estoque era feito bem à montante da cadeia, antes do processo de montagem, somente de peças. Esta prática permitia um nível de estoques muito menor na cadeia e um fluxo de material mais veloz, visto que não havia “paradas” do material para estoque.

Outro modelo é o “Engineer to order”, ou projeto contra pedido, onde o pedido é feito para o projeto do produto, seguido da fabricação e montagem. Ou até mesmo o “Resource to order”, ou recursos contra pedido, onde os recursos necessários para o processo produtivo só serão adquiridos após fechada a solicitação pelo cliente. É o caso de contratos de construção, por exemplo, onde as empreiteiras só compram o material, alugam as máquinas ou contratam a mão de obra após ganha a licitação e consolidado o contrato.

Cada um destes modelos é mais adequado para um determinado produto e condições específicas de cada setor, acrescentando vantagens e desvantagens. É muito interessante para as empresas utilizar os modelos “contra pedido”, já que o fluxo financeiro é muito mais veloz e o capital imobilizado menor. Porém uma variável extremamente importante é a questão tempo. Mas que tempo? Na verdade a comparação entre dois tempos: o tempo de fabricação até a entrega e o tempo aceitável de espera pelo cliente. Veja na figura a seguir





Quando o tempo de produção (P) suplanta o tempo aceitável de espera pela demanda (D), a empresa precisa manter um estoque para que o cliente possa garantir a compra, caso contrário estará perdendo a venda para outro fornecedor. À medida que o tempo aceitável de espera aumenta ou que o tempo de produção diminui, os processos vão partindo para modelos “contra pedido”.

Pela simples exposição destes conceitos, é fácil deduzir que, para otimizar os resultados, tanto para o cliente como para a empresa, um dos pontos mais importantes é a redução do tempo de produção e entrega ou a melhoria do produto de forma a otimizar a percepção de valor pelo cliente e, quando aplicável, permitir um tempo aceitável de espera maior pelo cliente.

Próximo aos conceitos de atendimento à demanda são os conceitos de estratégias de fornecimento. Quando temos sistemas onde o fluxo de materiais não leva em consideração necessidade do centro de consumo seguinte, temos um sistema com fluxo empurrado, ou push. Neste caso, as empresas “empurram” os materiais para os elos seguintes da cadeia, independente da necessidade imediata do outro. Ou simplesmente, enviam para estoque.

Quando o fluxo de materiais só ocorre de acordo com a necessidade do elo seguinte da cadeia, temos os fluxos ou estratégias puxadas, ou pull. É como se a demanda fosse “puxada” por cada centro consumidor pelo anterior.

Mas, por mais que pareçam óbvios estes conceitos e que estejam claramente relacionadas as estratégias a produtos específicos, ainda existe muita confusão sobre a forma de utilização. Afinal, por que indústrias automobilísticas concorrentes, por exemplo, trabalham com sistemas totalmente distintos. Basta entrar em uma concessionária ocidental, que atua com venda regular de carros para perceber a estratégia utilizada. Encontraremos um alto estoque de veículos na concessionária, pronto para o uso, seguindo uma clara estratégia empurrada. Quando entramos em uma empresa de origem japonesa, por outro lado, o sistema é outro: são pouquíssimos carros em estoque, mas com uma entrega rápida e eficiente, que permite que o seu veículo seja “puxado”, de acordo com a sua necessidade, entregue e fabricado de acordo com o seu pedido.

Essa simples comparação já mostra uma diferença drástica sobre a forma de atender ao cliente que implica drásticas melhorias de desempenho. Enquanto as empresas ocidentais tentam “empurrar” produtos aos consumidores, utilizando sistemas de distribuição com altíssimos estoques e alto custo, os japoneses entregam seus produtos sob encomenda e com muito menos capital imobilizado.

5. ESTRATÉGIAS PULL E PUSH

Para entender bem a adequação dos sistemas de entrega empurrados (push) ou puxados (pull) é preciso fazer um novo tour histórico, mas, desta vez, um pouco mais longo: antes da revolução industrial. Se classificarmos as formas de produção e de entrega de materiais antes da revolução industrial, nas antigas oficinas ou corporações de ofício, qual seria o modelo vigente mais comum: empurrado ou puxado?

Nesta época, as corporações de ofício fabricavam somente sobre encomenda, em pequenas quantidades, atendendo exatamente a necessidade do cliente. Caso fosse necessária uma roupa, um artefato, um equipamento, tudo seria produzido de acordo com a necessidade do solicitante, totalmente puxado pela demanda. Mas, o que mais caracterizava este esquema produtivo: o alto custo e a produção de pouquíssimas quantidades.

Este modelo começou a mudar quando, em 1777, Adam Smith escreve no segundo capítulo de sua mais conhecida obra, Tratado sobre a origem da Riqueza das Nações, sobre o esquema produtivo de uma fábrica de alfinetes. Nesta empresa, o volume de produção consegue aumentar de alguns poucos itens diários para milhares de itens somente com a inclusão de um nova característica para os processos: a divisão do trabalho. Ao invés de todo o fluxo ser realizado por um único profissional, que conheceria cada etapa, como um mestre no ofício, é feita uma divisão de tarefas em unidades mínimas e cada pessoa executa somente uma atividade especializada. Este simples princípio abre espaço para novas e novas oportunidades.

Com a Administração Científica, de Wislon Frederich Taylor, este princípio é amplamente utilizado, valendo-se de uma conduta científica pautadas em tempos e movimentos, que buscavam a eficiência máxima de cada atividade, cada elo do processo. Todo este processo acaba culminando em um incremento inacreditável de produtividade das empresas que cria o que chamamos de Revolução Industrial.

A seguir, vem a linha de produção, os trabalhos de ergonomia, e toda a tecnologia que profundamente dominamos em nossos processos produtivos, sejam industriais, sejam em prestação de serviços. A revolução industrial gerou frutos inimagináveis em nossos paradigmas de trabalho e de gestão.

Não restam dúvidas de que todo este modelo industrial gerou um sistema produtivo muito mais característico de estratégias empurradas, onde o objetivo principal era o barateamento da produção e o alcance em massa da população. Enquanto nos tempos medievais era extremamente caro produzir qualquer item, os volumes eram baixíssimos, a Revolução industrial cria um sistema que reduz de forma inimaginável os custos de produção. Quem teria condições de ter um automóvel no início do século XX? Somente os aristocratas e burgueses com grande poder econômico. Mas Henry Ford desenhou um modelo produtivo que objetivava um baixíssimo custo, de forma que todo cidadão americano, todo funcionário de sua empresa pudesse ter um veículo Ford.

Mas o século XX foi também um século de transformações e, pouco a pouco, novas necessidades foram sendo criadas pela sociedade industrial. O consumidor passa a demandar produtos cada vez mais personalizados, com alta variedade e baixo ciclo de vida. Enquanto um modelo de veículo antigo demorava anos para ser alterado, hoje é difícil estimar quando surgirá a nova versão de cada carro. O tempo é cada vez menor.

Começamos então a perceber a adequação de modelos diferentes dos empurrados, onde todos os bens eram padronizados e o cliente não poderia escolher a cor do seu veículo, já que o preto era o mais barato (a tinta secava mais rapidamente), passando a demanda a exigir uma mudança para os paradigmas puxados, afinal produzir para estoque não é mais uma boa prática.

E, afinal, quais serão as mudanças que estão relacionadas à transferência de uma estratégia empurrada para uma estratégia puxada? São significativas! Basta observar as mudanças de conceito em cada setor da organização.

Marketing

Se observarmos detalhadamente o setor de marketing para entender a diferença entre sua atuação em um modelo empurrado e um modelo puxado, é possível, à primeira vista não perceber nenhuma atividade diferente. Mas, procurando entender sua filosofia de atuação, perguntamos: qual a principal função de um bom profissional da área de marketing de uma empresa que trabalha seguindo a filosofia empurrada (push)? A área e os profissionais de marketing serão responsáveis por garantir a procura pelo produto, fazer com que o mercado consumidor se interesse pelo produto que eles têm a oferecer, mesmo que não tenham necessidade. Bom profissional é aquele que faz com que o cliente tenha a vontade de comprar areia no deserto, falando figurativamente. É o "P" da promoção, quando lembramos dos quatro "P's" do Marketing, de Kotler.

Mas, se pensarmos na filosofia do marketing em uma estratégia puxada (pull), a capacidade mais importante do setor e dos profissionais e outra: captar o que o cliente quer, quais suas necessidades e seus desejos antes mesmo do cliente saber, para enviar estas especificações para o setor de produção e entrega desenhar o produto ou serviço que agregará mais valor ao mercado. Nesta filosofia, o bom profissional de marketing é aquele que conhece o mercado, que sabe ler as necessidades dos seus consumidores, que consegue descobrir o que agrega valor ao cliente.

Preço

Vejamos uma outra situação: formação de preço. Imagine estar produzindo um determinado item em uma pequena empresa familiar e quer determinar qual o preço de venda do seu produto. Para nove em cada dez estudantes sobre a formação de preço, a resposta terá um padrão bem claro: calcule o custo de fabricação do seu produto, o custo das matérias primas e demais custos variáveis, o custo fixo que estará agregando em função de sua capacidade produtiva e, sobre este custo de produção, acrescente uma margem de lucro esperada. Assim, encontrará o seu preço de venda.

Tudo bem, nada de errado com esta abordagem. Porém, estamos falando somente da abordagem de um modelo de produção empurrado (push). É a abordagem clássica, tradicional, onde o custo é o que importa. Se desenharmos o contexto econômico nos primórdios da revolução industrial, destacaremos produtos pouco acessíveis, com alto custo de fabricação e baixa demanda, já que somente a classe mais abastada tinha capacidade econômica para adquirir os bens. Neste momento, o que importa é a diminuição do custo de produção, para ofertar bens mais baratos e ampliar a base de consumo. Quanto mais barato for o produto, mais consumidores terão acesso. E a principal forma de baratear a produção é através da padronização.

Desta forma, no modelo de produção empurrado, o mix de oferta é muito estreito, com baixa variedade de produtos a serem ofertados. O Ford “T” só possuía a opção de cor preta. Porém esta não é a realidade atual. A variedade produtiva é crescente e o principal motivador para a compra de diversos itens não é o preço. Aliás, em alguns casos, o preço não representa muita coisa para quem compra e cria situações absurdas.

É possível afirmar que existem produtos onde clientes distintos pagam preços diferentes pelo mesmo serviço ou produto, um cliente sabe do preço que o outro paga e, mesmo pagando a mais, não se importa? Parece absurdo, mas esta realidade existe e é mais frequente do que se imagina. E não estou me referindo a produtos com marcas diferentes ou entregues com padrão de serviço ou em localidades distintas. Vejam o exemplo das companhias de aviação. Há mais de 30 anos, quando compramos uma passagem para uma viagem aérea, um dos fatores determinantes é o tempo entre a ida e a volta. Mas, espere um momento, por que o tempo entre a ida e a volta? Afinal, é fácil entender um preço mais caro por uma passagem em um horário melhor, em um período de férias ou maior demanda, em uma passagem com mais benefícios, mas pelo tempo entre ida e volta?

Isto é explicado por uma simples expressão: segmentação de mercado. Qual a diferença entre um cliente que compra uma passagem de avião com 20 dias entre tempo de ida e volta e um passageiro que compra para voltar ou outro dia? São públicos diferentes, com objetivos distintos. Enquanto o primeiro, com um longo tempo entre ida e volta, está buscando uma viagem de férias, a passeio, o segundo está viajando a trabalho. Logicamente, os interesses são outros e o valor percebido pelo serviço é outro. Assim, mesmo sabendo que está pagando mais caro, quem compra uma passagem para ir e voltar no outro dia não se importa, pois precisa desta passagem, está indo a trabalho, para fechar um negócio, para desenvolver alguma atividade. Já o cliente que vai passear ou de férias, se for, caro ele não vai. Escolherá outra opção.

São então serviços exatamente iguais, na mesma companhia aérea, com o mesmo horário, mas com preços distintos... mesmo com o custo idêntico. Isto revela que o preço não tem nenhuma relação com o custo. O preço é dado pelo mercado. No primeiro modelo, empurrado, o custo é a variável independente e o preço, a variável dependente. No modelo puxado, o preço é que é a variável independente. Outros exemplos: um restaurante em Londres em que o cliente escolhe o preço que irá pagar pela comida após comer; paga o que acha que vale a comida. Uma banda australiana que vende o seu CD pela Internet com o mesmo critério: o cliente paga quanto quer! E na última consulta, o preço médio pago estava em treze dólares australianos. Em algumas montadoras de carro no Brasil é possível encontrar exatamente a mesma peça com preços totalmente diferentes, a depender do tipo de veículo a que esteja veiculada.

Quando amarramos o preço ao custo do produto, além de ficarmos presos a uma estrutura de custeio determinada, podemos estar perdendo uma grande oportunidade de otimizar o lucro do negócio. É possível garantir que o preço calculado seja o mesmo que o cliente está disposto a pagar? E se o cliente estiver disposto a pagar mais que o calculado com base nos custos. O preço, em sua estrutura mais moderna, deve estar sendo sempre levantado com base na necessidade do mercado e na sua percepção de valor pelo produto. O custo, no máximo, deve servir como um limitador para preço mínimo. E mesmo assim, estamos falando do custo variável, somente.

Estoques

Um outro ponto de destaque, agora diretamente relacionado à atuação logística: os estoques. Primeiramente vamos observar a sua classificação contábil com mais uma questão: por que os estoques são colocados no balanço com um ativo? Obviamente, porque são itens que, quando vendidos, representarão uma receita esperada para a empresa, responderão os contadores. Bem, mas os ativos são importantes e, para uma melhor posição com relação ao patrimônio líquido, quanto mais estoque, melhor. Isso quer dizer que, quanto mais ativos, melhor?


Neste modelo, o estoque é visto como um ativo, pois será vendido em breve, é um ativo circulante. Os estoques servem para maximizar a eficiência produtiva, ampliar o ganho de escala, diminuir os custos e, assim, garantir mais vendas.

Entretanto é valido, ainda, nos dias atuais, classificar o estoque como um ativo? De fato, muitos são os autores que já afirmam estar os estoques se transformando em um grande passivo para as cadeias de suprimento. Wankee (2003) aponta que as empresas estão continuamente buscando atender bem sua demanda com o menor nível de estoque possível. Dentre os motivadores para esta atitude, se destacam:

• A variedade crescente do número de produtos torna mais complexa e trabalhosa a determinação dos tamanhos de lote, dos pontos de pedido e dos estoques de segurança. Como exemplo, as cervejarias brasileiras que, em 1985, comercializavam um único tipo (pilsen) numa única embalagem (a garrafa de 600 ml). Atualmente, são oferecidos diferentes tipos (encorpado, seco, leve, etc.) em diversas embalagens (lata, long neck, latão, long leck com boca larga, torcida, etc.).
• O elevado curso de oportunidade do capital, reflexo das proibitivas taxas de juros brasileiras, que tem tornado a posse e manutenção dos estoques cada vez mais cara. Por este e outros motivos, a questão da taxa de juros está continuamente entre os debates econômicos.
• O crescente foco na redução do capital circulante líquido (diferença entre ativo circulante e passivo circulante), um dos indicadores financeiros mais observados por empresas que desejam maximizar seu valor de mercado.

Os estoques vêm sendo, de fato, transformados em grandes passivos na gestão atual das cadeias de suprimento. São atualmente identificados, ao menos, três grandes fatores de relevância entre os malefícios do excesso de estoque na cadeia de suprimentos: custo, tempo e qualidade.

O impacto dos altos estoques nos custos é amplo, podendo ser revelado em diversas dimensões. Segundo Simchi-Levi et al (2003), os componentes principais dos custos dos estoques e dos depósitos são:

• Custos de manipulação. Esses incluem custos de mão-de-obra e de equipamentos, proporcionais ao fluxo anual de cada depósito.
• Custos fixos. Esses compreendem todos os componentes de custo que não são proporcionais à quantidade de material que passa pelo depósito. Normalmente, o custo fixo é proporcional ao tamanho (capacidade) do depósito, mas de uma maneira não linear, já que este custo está ligado às faixas de tamanho e capacidade do depósito.
• Custos de armazenamento. Representam os custos de se manter estoque, os quais são proporcionais aos níveis médios de estoque. Incluem custo de manutenção das instalações, custos de obsolescência, derivado do risco de um item perder valor em razão de mudanças do mercado; tarifas governamentais, tarifas de propriedade e de seguro de estoques.
• Custos de oportunidade, relativo ao retorno que seria recebido se o investimento fosse em algo diferente, por exemplo, o mercado de valores. Estes, por sua vez, tem sido considerados os mais importantes, dado a grande quantidade de material atualmente imobilizado pelas empresas e as altas taxas de juros oferecidas no mercado brasileiro.
Custos de Estoques


Custos de Capital Juros
Depreciação
Custos de Manutenção Equipamentos de movimentação
Deterioração
Obsolescência
Custos com Edificação Aluguel
Conservação
Seguros
Custos com Pessoal Salários
Encargos Sociais


Mais difícil de ser percebido, mas nem por isso menos importante, é o impacto dos estoques no lead-time de produção e logístico. O lead-time é o tempo decorrido desde o início do processo produtivo até o seu final, ou até a entrega do produto ao cliente. Assim, um indicador importante para a produtividade ou para a efetividade de um sistema logístico, normalmente serve para apontar quanto tempo decorre para o atendimento ao cliente se não houver item no estoque. Segundo Chopra (2003), o estoque exerce também um grande impacto no tempo de fluxo do produto em uma cadeia de suprimento.

Mas, qual a influência dos estoques no tempo, ou no lead-time? Os japoneses foram os primeiros a apontar a influência negativa dos estoques no lead-time, quando criaram o modelo Just In Time. Inicialmente entendemos o estoque como algo positivo, que garante a entrega do produto mais rapidamente ao cliente. Então, por que os japoneses o consideram prejudicial, inflador do lead-time?

A manutenção de estoques, tanto de matéria-prima, quanto de produtos em processo ou de material acabado é parte fundamental para o processo produtivo e, como conseqüência, o tempo de manutenção dos estoques também faz parte do lead-time, ou do tempo de processo. Assim, quanto mais estoques mantemos em um sistema, mais tempo demora para o material fluir pelo sistema e, consequentemente, maior o seu lead-time.
Para demonstrar esta afirmação, vamos supor a existência de duas empresas que possuem exatamente o mesmo sistema produtivo, com uma única diferença: o nível de estoque que mantém na produção, representadas na figura abaixo.

Cada retângulo indica um processo, seja de produção, seja logístico, em um sistema seriado e com tempo de 1 dia para a sua execução. A empresa na linha superior possui cinco dias de estoque antes e depois de cada etapa, mantendo mais material para evitar as paradas e faltas. Já a empresa da linha inferior possui somente um dia entre cada etapa.





Então, qual o lead-time do processo, ou seja, quanto tempo demora desde a entrada do primeiro material na linha de produção até ele ser entregue ao cliente? Enquanto no primeiro processo a soma do tempo de processo e de estoques perfaz 35 dias, no segundo, somente 11 dias. Assim, quanto mais estoque há em um sistema logístico, mais tempo demora para fluir o material e, quando se trata de um material que não existe na linha, mais tempo demora para o cliente ser atendido. Tempo de estoque significa tempo de material parado no processo, essa é a principal conclusão.

Já com relação ao impacto na qualidade, os estoques são considerados muito prejudiciais por alguns pontos óbvios. E aqui não nos referimos somente aos materiais com alta obsolescência ou muito perecíveis. Mesmo a produção de materiais pouco perecíveis e de longa vida útil é prejudicada. Somente o fato de ter muito material disponível em estoque já causa um efeito psicológico negativo, de pouca preocupação ou desprezo com as falhas. Se existe excesso de material na área, qualquer falha é encoberta ou pode ser rapidamente reposta pelo material em estoque. Por outro lado, se temos pouquíssimo material em estoque, a preocupação e o zelo é muito maior. Qualquer parada ou qualquer erro implicará a falta do produto final ou não entrega.

Além do efeito psicológico, outro fator está relacionado ao tempo de detecção e indicação dos erros. Imaginemos o exemplo da empresa anterior, onde há cinco dias de estoque entre os processos produtivos. Quanto tempo demora para a percepção de uma falha no processo pelo processo seguinte se não for detectado pela inspeção inicial? Pelo menos cinco dias, que é o tempo que demora para iniciar a produção na etapa seguinte. Porém, se há somente um dia em estoque, o material chegará em um dia no setor seguinte e o erro será descoberto mais rapidamente. Podemos até levar em consideração que durante este tempo, há a possibilidade de estarmos produzindo erradamente, já que não descobrimos a falha.

Assim, muitos autores comparam os estoques como o nível de um rio ou de um lago; quanto mais alto o nível, mais difícil de perceber as pedras, os obstáculos. Nesta analogia, o nível do estoque é o nível do rio e as pedras são os erros, as falhas do processo. Isto quer dizer que os estoques altos encobrem as falhas, dificultando a identificação da causa real de cada problema no processo e, consequentemente, dificultando a correção das causas. Os estoques servem para esconder, camuflar os erros e as falhas. Assim, não é possível conduzir uma melhoria contínua.






O nível de estoque comparado ao nível de água em um rio

Desta forma é possível perceber que a transição de um modelo logístico empurrado, característico da primeira fase da Revolução Industrial, para os sistemas puxados, iniciados pelo Just In Time, do Modelo Japonês, implicam transformações em sistemas e paradigmas diversos de gestão. Somente realizar a produção se baseando em previsões de demanda e empurrando para o cliente o que reflete o melhor produto para o negócio é uma característica cada vez menos freqüente nos modelos produtivos.

Por outro lado, mudar para um sistema totalmente puxado, onde a demanda real e a necessidade do cliente é que determinam o que vai ser produzido e entregue, onde os estoques são mínimos e a produção e entrega só ocorre após a realização do pedido, se torna um desafio muito forte. Por isso, Simchi-Levi (2003) aponta a possibilidade de sistemas híbridos, push-pull, onde parte do processo é empurrado e parte é puxada na cadeia de fornecimento. Assim, é possível unir o melhor de cada modelo: a otimização dos custos do sistema empurrado e o foco ao cliente do sistema puxado.

Convém estarmos atentos à mudança contínua que existe nos sistemas logísticos, decorrentes da natural evolução dos processos e da sociedade em que estão inseridos. Assim, enquanto no passado distante o custo de produção era o principal limitador e a população mundial possuía uma demanda muito superior à capacidade total de produção e entrega; hoje há uma sobra na capacidade de produção de alimentos, bens e serviços.

O que se vislumbra para um futuro muito próximo, ou, por que não dizer, já no presente, é a limitação de recursos naturais. Água, energia, petróleo e outros insumos já são fonte de preocupação de muitos ambientalistas, sem contar os impactos causados pela disposição dos rejeitos dos sistemas produtivos. O meio ambiente não suporta mais o modelo produtivo atual. Se repetirmos as condições projetadas como ideais, pelas comunidades mais desenvolvidas, para toda a população mundial, o planeta é que não teria recursos suficientes para suprir as necessidades nem meios possíveis para a recuperação dos dejetos deste modelo.

6. FUNÇÕES DA LOGÍSTICA

Apesar de ser crescente a tendência de desenvolvimento de trabalhos com a logística de forma integrada, observando os processos e não as áreas separadamente, é importante a observação e estudo das funções ou atividades típicas da logística de forma diferenciada. À medida que as empresas interagem em processos cada vez mais complexos, com organizações multinacionais, serviços diferenciados e parcerias de diversos níveis, fazer tudo é como tentar construir a própria casa: os resultados provavelmente serão muito piores e os custos, muito altos.

Desta forma, podemos distinguir as seguintes funções principais, dentre as atividades logísticas:

• Compras, aquisição e suprimentos;
• Administração de materiais, gestão de estoques e armazenagem;
• Programação, planejamento e controle da produção;
• Distribuição, transportes e administração de tráfego;
• Gestão das informações.


Compras, aquisição e suprimentos

Ballou (1993) relaciona a aquisição às atividades que ocorrem entre a organização e os seus fornecedores e, geralmente, dá a impressão de tratar-se de compras. Mas, designa os aspectos da obtenção que afetam a disponibilidade e o fluxo do suprimento. Apesar de o preço e a qualidade do produto serem variáveis vitais na escolha de um fornecedor, a terceira variável chave é a disponibilidade de entrega.

Um dos pontos principais relacionados à área de suprimentos está na política de determinação dos fornecedores, relativa a um ponto principal: qual a melhor estratégica; escolher um fornecedor cativo ou trabalhar com múltiplos fornecedores?

Esta é mais uma das muitas perguntas sem resposta única e que está relacionada as características de cada empresa. Contudo, vem sendo percebida uma crescente tendência na formação de parcerias para fornecimento cativo em organizações de classe mundial. O sucesso na formação destas parcerias merece uma disciplina ou um capítulo à parte para ser discutido.

Enquanto Ballou (1993) aponta que as firmas geralmente estabelecem uma política de manter pelo menos dois fornecedores para cada item crítico, assegurando, assim, um fluxo contínuo de materiais caso haja uma parada inesperada em alguma das fontes, assim como um certo grau de competição entre eles, nem sempre este é um ponto dominante.

Chopra (2003) mostra algumas razões para a obtenção de ganhos na criação de confiança e parcerias estratégicas, a saber:

1. Conquista-se um alinhamento mais natural entre incentivos e objetivos. Quando os estágios possuem confiança mútua, têm mais chances de levar o objetivo das outras partes em consideração ao tomar suas decisões;
2. As medidas gerenciais orientadas por ações para atingir coordenação tornam-se mais fáceis de serem implementadas. O compartilhamento de informações ocorre naturalmente entre as partes que estabeleceram uma relação de confiança entre si. Da mesma maneira, a implementação de melhorias operacionais torna-se mais fácil e o projeto de esquemas de preço adequados também é simplificado se ambas as partes têm como meta o bem comum;
3. A eliminação de duplicação de tarefas ou a alocação de esforços no estágio mais apropriado levam ao aumento na lucratividade da cadeia de suprimento. Por exemplo, um fabricante recebe material de um fornecedor sem inspecioná-lo desde que o fornecedor compartilhe suas planilhas de controle de processos. Outro exemplo é a situação em que o distribuidor dá subsídios à estratégia de adiamento de um fabricante realizando a customização um pouco antes do ponto de venda.
4. Ocorre um maior compartilhamento de informações detalhadas sobre vendas e produção. Este compartilhamento permite que a cadeia de suprimento coordene decisões acerca de produção e distribuição. Consequentemente, a cadeia de suprimento torna-se mais capaz de sincronizar oferta e demanda, levando uma coordenação melhor.

Assim, desde uma maior velocidade no processo de compra, já que as cotações não são necessárias, o fornecedor muitas vezes já acompanha o estoque no ponto de suprimento, a tecnologia de informação já permite trocas de dados, etc., o potencial de ganhos é muito forte. Porém, esta formação não é uma panacéia. Em muitos dos produtos ou serviços, a competição se torna a melhor opção, com a determinação de dois ou mais potenciais fornecedores que dividem o fornecimento.

Sendo um setor que detém uma parcela representativa dos custos empresariais, diversos são os pontos possíveis de otimização e estudos, como quantidade ideal de compra, programação do momento ideal de compra, determinação de fazer ou comprar, preços, formas de transporte, etc.

Administração de materiais, gestão de estoques e armazenagem

Para melhor entendermos os pontos de estudo relativos aos estoques, vamos dar início através de uma análise simples: já que os estoques têm se tornado um problema, um passivo, conforme comentado anteriormente, por que existem os estoques? Para que servem? Se conseguirmos entender a razão de sua existência, poderemos encontrar pontos para melhoria de sua gestão.

Chopra (2003) afirma que o estoque existe devido a uma inadequação entre suprimento e demanda. Já Ballestero-Alvarez (2001) faz uma comparação entre os estoques e um reservatório de água, que equilibra o consumo e a demanda. De forma mais ampla, os estoques existem por duas causas fundamentais: incerteza e economia de escala.

Incertezas de diversos tipos: incerteza na demanda, na medida em que, se soubéssemos o que cada cliente irá solicitar, no seu momento e local exato, poderíamos postergar a produção para que o produto chegasse ao local exatamente no instante do consumo; incerteza no fornecimento, já que não temos a garantia de que o fornecedor irá nos entregar o material sempre no momento exato, mantendo, por isso, um estoque de matéria-prima; e, finalmente, incerteza no nosso próprio processo produtivo, já que podemos atrasar a entrega, máquinas podem quebrar, peças podem ser produzidas com defeito, pode haver greve, etc.

Outra razão da criação dos estoques é pela possibilidade de otimização de custos e ganho de escala. Se for feita uma remessa de material para determinada região, por que não fechar uma carga completa de transporte, já que o carreto já está pago, diminuindo o custo unitário de transporte? Quando é feito um lote de produção, muitas vezes excedendo o pedido feito pelo cliente, as peças produzidas a mais vão para estoque em uma tentativa de reduzir os custos de set up, as eficiências, evitar paradas desnecessárias, etc.

Assim, o estoque existe justamente devido às falhas que existem em nosso processo. O que leva à primeira percepção: para reduzir os estoques, é preciso criar sistemas e mecanismos de minimização de falhas. Esta foi a primeira lição desenhada pelo modelo japonês de produção e todos os processos que envolvem a gestão pela qualidade total.

Com base nessa justificativa para a existência de estoques é possível desdobrar uma série de estratégias para a sua melhor utilização. A melhoria das formas de previsão de demanda, por exemplo, é uma maneira de racionalizar os estoques de produtos acabados e permitir um fluxo mais contínuo de material com melhor atendimento ao cliente. Assim, os modelos de previsão de demanda, sejam subjetivos ou objetivos irão determinar um papel crucial para a gestão dos estoques e da demanda. As ferramentas de melhoria da produção como qualidade total, seis sigma, teoria das restrições, etc. terminam sempre resultando em níveis mais adequados de fornecimento com a mínima utilização de recursos.

Chopra (2003) coloca o estoque como de participação crucial na capacidade da cadeia de apoiar a estratégia competitiva da empresa. Se esta exige um alto nível de responsividade, a empresa pode usar o estoque para alcançar esta responsividade, disponibilizando grandes quantidades de estoques próximas ao cliente. Contrariamente, a empresa pode também usar o estoque para se tornar mais eficiente, reduzindo-o com a utilização de armazenagem centralizada.

Assim sendo, as principais decisões relacionadas a estoques são ligadas a: Quanto pedir? O que pedir? Como pedir? Quanto pedir?

Para a determinação de cada uma destas respostas, são usados diversos modelos de decisão, muitos dos quais através de métodos quantitativos que se valem de análises estatísticas para uma melhor administração dos estoques de um sistema logístico. Assim, dentre as diversas fórmulas e os diferentes métodos de gestão de estoques, é sempre importante identificar se as premissas e os pressupostos utilizados estão de acordo com a situação e o contexto do seu negócio.

Programação, Planejamento e Controle da Produção

Uma primeira observação sobre o título, palavra por palavra, do assunto geralmente nos leva a uma indagação: qual a diferença de programação e planejamento? Isso já que, à primeira vista, os dois termos possuem o mesmo caráter relacionado à preparação do que está por vir, já que ambos se destinam à etapa inicial da organização e da gestão produtiva?

O real motivo da existência do Planejamento e da Programação não é bem percebida na língua portuguesa, mas é explicada pela língua de origem, a americana. Em inglês, “planning”, planejamento, ou “scheduling”, programação, se referem a dois termos claramente distintos. Enquanto o primeiro apresenta um caráter mais transitório, mais mutável, já que o planejar se apresenta como algo sujeito a imprevistos e mudanças; o segundo, a programação, já tem um significado mais definitivo, representando a programação do que será realizado no dia, como um programa de computador, menos sujeito a mudanças e ajustes. Até mesmo pela grande presença da computação nesta etapa da logística – de fato, o computador começou a penetrar na gestão empresarial justamente para o PPCP, com o MRP – é percebida esta ambigüidade nos termos, mas muitos dos autores e das empresas, preferem ser mais objetivos e tratar somente como PCP – Planejamento e Controle da Produção.

Segundo Tubino (2000) em um sistema produtivo, ao serem definidas suas metas e estratégias, faz-se necessário formular planos para atingi-las, administrar os recursos humanos e físicos com base nesses planos, direcionar a ação dos recursos humanos sobre os físicos e acompanhar esta ação, permitindo a correção de prováveis desvios. No conjunto de funções dos sistemas de produção, essas atividades são desenvolvidas pelo Planejamento e Controle da Produção.

Para atingir seus objetivos, o PCP administra informações vindas de diversas áreas de um sistema produtivo. Da Engenharia do Produto são necessárias informações contidas nas listas de materiais e desenhos técnicos da Engenharia do Processo, os roteiros de fabricação e os lead times, no Marketing buscam-se os planos de vendas e pedidos firmes, a Manutenção fornece os planos de manutenção, Compra/Suprimentos informa as entradas e saídas dos materiais em estoques, dos Recursos Humanos são necessários os programas de treinamento, Finanças fornece o plano de investimentos e o fluxo de caixa, entre outros relacionamentos. Como desempenha uma função de coordenação de apoio ao sistema produtivo, o PCP de forma direta, como as relações citadas dentro do parágrafo com os demais setores, ou de forma indireta, relaciona-se praticamente com todas as funções deste sistema.


As técnicas e metodologias de planejamento e controle dos recursos da produção vem ainda evoluindo, possuindo atualmente um leque de opções e modelos de planejamento que precisam estar perfeitamente adequados às estratégias logísticas. Assim, é possível encontrar sistemas avançados de planejamento ou softwares de controle que obedecem algoritmos diversos.

O MRP – Material Requirements Planning – primeiro sistema destinado a este tipo de atividade, segue uma lógica empurrada, onde as previsões e pedidos são desdobrados de acordo com a lista de materiais, os estoques disponíveis e os ciclos produtivos, fazendo o planejamento nível a nível.

O Just In Time, filosofia totalmente puxada, já se utiliza do kanban, método de origem japonesa que empregava inicialmente cartões, possui diversas variações, desde o kanban de um cartão, dois cartões ao kanban eletrônico.

O Tambor-Pulmão-Corda, da revolucionária Teoria das Restrições é bem mais recente, sendo inicialmente proposto em 1984 como solução para a logística de produção seriada pelo físico israelense Eliyahu Goldratt, através também de um programa de computador, o OPT – Optimized Production Technology – vindo a se mostrar posteriormente como uma solução ainda mais eficiente que o Just In Time para minimizar os estoque e aumentar a confiabilidade de entrega.

Apesar de ainda ser comumente empregado no Brasil sistemas com desdobramentos baseados no MRP, é crescente a disseminação de sistemas adequados às estruturas puxadas, colaborando para uma maior participação do PCP na garantia da confiabilidade logística.

Distribuição, transportes e administração de tráfego

A distribuição é uma das áreas que mais cresce em importância no âmbito da logística contemporânea. À medida que o varejo vai ganhando importância na determinação das opções de compra do consumidor final, a capacidade da distribuição de proporcionar entregas adequadas, oportunas e a baixo custo, melhor organizando os canais de transporte e as rotas de tráfego surge como um grande diferencial para se manter em um cenário cada vez mais competitivo.

O cenário varejista na década de 80 apresentava características radicalmente distintas das atuais na medida em que os fabricantes possuíam grande poder nas opções de escolha do cliente final. Em uma época marcada pela inflação, onde as filas de supermercado se destacavam nos dias de pagamento, com consumidores que buscavam a compra do mês como opção para evitar as constantes remarcações, estava no fabricante a maior força de determinação da compra. Dificilmente um consumidor escolheria um produto de uma marca desconhecida, um material novo ou uma opção a mais.

Mas atualmente o que é claramente percebido na opção de compra dos clientes é a escolha do ponto de venda, da rede de varejo percebida como mis adequada. Desde pequenos supermercados de bairro a redes multinacionais, as opções mais comuns são de compras pequenas, determinadas pelas opções que estão no varejista, sendo que a marca nem de perto apresenta a mesma força que no passado.

Segundo Zylstra (2008), algum tempo atrás, a função de distribuição esteve focada principalmente no volume de estocagem na carga do palete e em caixas estocadas para embarque de pedidos de clientes individuais. Ela desempenhou o simples papel de pulmão de tempo e de estoque entre as quantidades e os lotes grandes de produção na fábrica e as quantidades menores pedidas pelos clientes. Estratégias de distribuição, locais de armazéns, níveis de serviço e operações se formavam em torno desse papel, resultado em muitas das instalações, processos de negócio, tecnologias e políticas que hoje são utilizados.

As funções de distribuição tradicionais têm sofrido críticas à medida que o ambiente de negócios e a concorrência estão mudando. Os canais de vendas têm se expandido com a inclusão do comércio eletrônico e outros canais de embarque direto têm aumentado as taxas de pedido, reduzindo as quantidades por pedido e modificado o mix de transporte de distribuição. A concorrência está mudando o papel tradicional d distribuição à medida que os clientes estão tendo mais sucesso na redução de preços e na obtenção de políticas de serviço mais restritas. A tecnologia da Informação (TI) está fornecendo novos caminhos para melhorar as operações, especialmente para os clientes quanto eles fornecem e demanda mais investimento de TI e suporte. Em cada uma destas tendências, o tradicional mantra da distribuição de estocar, manter e embarcar está mudando rapidamente para um serviço mais rápido, mais barato e mais personalizado.

A capacidade de melhor escolher os canais de transporte e o esquema de administração de tráfego, serão mais ou menos determinantes quanto maiores forem as opções de entrega. Neste caso, infelizmente o Brasil ainda apresenta um cenário extremamente limitado, dada a enorme concentração nos canais rodoviários, mesmo com dificuldades de escoamento ainda enormes e com uma malha rodoviária pública de péssimas condições.

Gestão das Informações

Consenso entre os mais diversos autores, a logística só alcançou o atual patamar de integração graças aos avanços da tecnologia de informação e da acessibilidade dos computadores tanto às empresas, quanto aos consumidores. É certo que neste início de século é possível relacionar quase todos os avanços nas mais diversas áreas à possibilidade de utilizar a geração digital e as novas tecnologias para otimizar performances e garantir resposta imediata às demandas. Entretanto, a logística e, posteriormente, a gestão da cadeia de suprimentos, se destacam neste panorama desde que áreas como a pesquisa operacional e os métodos quantitativos começaram a proporcionar ganhos de desempenho ao setor, ainda em meados do século XX, com o início do crescimento do setor após a segunda guerra mundial.

Segundo Taylor (2005), há 50 anos, as cadeias de suprimentos eram projetadas e gerenciadas através das consagradas ferramentas papel e lápis, com uma pequena ajuda de calculadoras. Hoje, seria quase inadmissível operar uma cadeia de suprimentos enorme sem o suporte contínuo dos softwares. Mas existe uma variedade estonteante de opções de software, e a escolha do pacote errado pode levar sua cadeia de suprimentos à inércia.

Simchi-Levi (2003) afirma que a tecnologia de informação (TI) é um importante habilitador da gestão eficaz da cadeia de suprimentos. Muito do interesse atual pela gestão de cadeias de suprimentos é motivado pelas possibilidades que são introduzidas pela abundância de dados e pelas economias inerentes às análises sofisticadas destes dados. As oportunidades inovadoras trazidas pelo comércio eletrônico (e-commerce), especialmente com a Internet, também têm aumentado o interesse pela TI.

Para muitas empresas, a TI proporciona uma vantagem competitiva. Mesmo que isso seja verdade há algum tempo em segmentos de serviços tais como bancos, também está se tornando mais relevante para grandes varejistas, companhias aéreas e empresas de manufatura. Exemplos famosos incluem a Wal-Mart com sua tecnologia de informação conectada por satélite, a América Airlines com seu inovador sistema de reservas denominado Sabre e a Federal Express, com seu magnífico sistema de rastreamento.

Zylstra (2008) complementa que os processos de negócio de distribuição têm vivenciado uma transformação de melhoria tecnológica. Uma vez que o fluxo de pedido do cliente e outras transações de distribuição são automatizados, o banco de dados do Planejamento de Recursos Empresariais (ERP) acumula os dados provenientes de toda a rede de distribuição. Essa base de dados principal de informação da distribuição tem habilitado o planejamento da distribuição para toda empresa que pode transcender os seus locais. A mudança de foco é para o planejamento e a tomada de decisão mais centralizados em vez de em cada armazém ou centro de distribuição (CD).

7. NOVAS TENDÊNCIAS

É sempre arriscado falar sobre novas tendências ou tecer previsões em um mundo cada vez mais dinâmico e surpreendente, onde a inovação é base da competitividade e nem mesmo os modelos econômicos parecem estáveis a ponto de garantir uma continuidade do capitalismo para as próximas duas décadas. Inovações tecnológicas, pressão ambiental, mudanças populacionais e sociais, novos materiais... é fácil perceber vertentes comuns de forma mais ampla nos modelos futuristas, mas também já é possível perceber tendências mais específicas em andamento, capazes de mostrar um direcionamento já claro para a gestão logística.

De forma muito ampla os modelos de gestão “enxutos”, onde a quantidade de estoque é mínima e os processos acontecem de forma puxada ou sincrônica – onde sistemas computacionais regulam o fluxo antecipando tendências reais à jusante da cadeia para os demais elos, entes mesmo de ser puxado – acabam por se demonstrar uma grande vantagem e uma lógica direção para os sistemas mais avançados. Mesmo em produtos onde o ganho de escala é que define a concorrência, commodities, materiais de baixa diferenciação e alto custo de transporte, etc. é possível perceber vantagens em controles de materiais e acompanhamento da demanda para a otimização do caixa.

Assim, passando por modelos híbridos, push-pull, as tecnologias puxadas vêm ganhando força. Desde o Just In Time até o Supply Chain Management, Lean Six sigma, Efficient Consumer Response, Lean Distribution, Quick Response e outras siglas que surgem a cada dia, adaptando novas condições e novas realidades a ferramentas mais adequadas.

É também claramente perceptível a diferenciação como uma forma de melhor atender ao consumidor, buscando, logicamente, formas de minimizar o impacto desta diversificação de materiais no aumento de estoques. Assim, técnicas como Vendor Managed Inventory, ou estoque gerenciado pelo fornecedor, Postponment ou diferenciação adiada, personalização em massa, etc. vão buscar garantir uma entrega cada vez mais adequada às necessidades dos clientes.

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